Meu tio-avô, artigo de Robério Braga

Meu tio-avô

Meu tio-avô é artigo em que Robério Braga dá os detalhes da vida de Paulino Mello, que fez carreira no Amazonas e terminou como desembargador

Robério Braga*

De uns tempos para cá tenho andado procurando informações detalhadas sobre meus ancestrais mais próximos, seja da origem portuguesa-baiana de meu pai, seja da origem holandesa-pernambucana de minha mãe. Nesse caminho, árduo caminho a procura de fontes que me auxiliem na pesquisa, visto que os mais antigos que poderiam contribuir nesse intuito já residem em outros planos espirituais, venho conseguindo seguir, razoavelmente, a trilha da família de minha mestra e mãe extremada – a família Santos Pereira – do Pernambuco.

Nesse campo é que se inscreve meu tio-avô, Paulino João de Souza e Mello, irmão de minha avó Maria Cândida Sampaio Pereira, a quem minha mãe chamava de “tio Paulino”, o qual, nascido no Recife e ali formado em Direito como muitos outros brasileiros de várias plagas, veio trabalhar em Manaus, seduzido pela prosperidade do lugar em pleno apogeu da economia gomífera, nos primeiros anos de 1900, logo após a formatura.

Pouco depois de seu desembarque na capital amazonense, ingressou nas carreiras jurídicas do Estado e, após experiências de curta duração no interior do Estado, como em Parintins, e juiz de Direito do 1º Distrito, foi nomeado procurador-geral do Estado em substituição a José Tavares da Cunha Mello, que faleceu no exercício do cargo. Paulino permaneceu nesta importante função de 15 de fevereiro de 1902 a 8 de novembro de 1903, sendo depois nomeado desembargador do Tribunal de Justiça do Amazonas, quando da aposentadoria de Francisco Caetano da Silva Campos, assumindo o cargo em 22 de novembro de 1903.

Seu substituído na procuradoria-geral foi Dr. Benjamin de Souza Rubim, que logo depois também seria elevado a desembargador, em 1º de dezembro, na vaga de Joaquim Cândido Ferreira Lisboa, por sua vez substituído na procuradoria pelo Dr. Benício Tavares da Cunha Mello.

Reconhecendo seu trabalho profissional, o governador Silvério Nery a ele se referiu com encômios em mensagem ao Poder Legislativo do Estado, afirmando: “Antigo magistrado no Estado, o qual por toda a parte onde tem exercido a judicatura se há imposto ao respeito e à estima dos seus jurisdicionados”, conforme consta na mensagem governamental de 10 de julho de 1902. Logo Silvério, que diziam ser difícil de reconhecer méritos e de trato com ostentação sobre os “humanos” e se constituiu em chefe político mais longevo da história política do Amazonas.

Não só como jurista, Paulino de Mello granjeou simpatia e respeito no Amazonas. Maestro, pianista, violinista, líder de grande número de pernambucanos residentes em Manaus. Dentre centenas deles estavam Arthunio Vieira, Benedicto Sampaio (também meu tio avô), Evaristo Wanderley, Gaspar Guimarães (de sentenças referenciadas Brasil afora), Araújo Filho (o grande jurista do seu tempo). Foi Paulino que ajudou a organizar a comunidade de olindenses e recifenses e foi presidente do Clube Pernambucano, que não só congregava os seus coestaduanos, mantinha as tradições da terra e promovia saraus lítero-musicais, como os auxiliava quando necessário.

Criou e dirigiu o Conservatório de Música que funcionava no antigo prédio da Rua José Clemente, ao lado do Teatro Amazonas, no qual anos mais tarde funcionou o Grupo Escolar “Marechal Hermes” e em cujo local se encontra o edifício da Rádio Rio Mar e com alunos e professores realizava concertos no Teatro sempre com sucesso.

Jurista de escol, musicista e professor, Paulino não mereceu, ainda, nenhuma homenagem prestada pelo Estado cuja prosperidade ajudou a construir.

Robério Braga

Robério Braga

* Robério Braga é professor, advogado e escritor, membro do Instituto Geográfico e Histórico e da...

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