Projeto desenvolvido por equipe do TJAM tem como foco homens condenados por violência doméstica

Projeto desenvolvido por equipe do TJAM tem como foco homens condenados por violência doméstica

Em atividade há pouco mais de um ano, o “Grupo Reflexivo e Responsabilizante” já soma 64 atendimentos de homens que responderam a processos iniciados nas “Varas Maria da Penha”, e que estão cumprindo alternativa penal (suspensão condicional da pena), sob o acompanhamento da Vara de Execuções de Medidas e Penas Alternativas (Vemepa). O objetivo do projeto é contribuir para a prevenção de novos ciclos de violência, a partir da abordagem de temas como questões de gênero, direitos humanos e construção social das masculinidades.

A iniciativa do projeto foi do Núcleo de Assessoramento e Apoio designado pela Coordenadoria Psicossocial Judicial do TJAM para atuar junto à Vempa. A psicóloga Bárbara Silva da Rocha, uma das responsáveis pelo projeto, destaca que além das políticas de proteção à mulher, que vêm sendo reforçadas no contexto da violência doméstica e familiar, é importante também voltar o olhar para os homens e trazê-los para o diálogo.

Projeto

“O nosso projeto os direciona a avaliar suas atitudes para que possam se responsabilizar, refletir sobre as suas vivências cotidianas e ainda para pensarmos em outras formas de socialização masculina, ou de socialização das masculinidades. Penso que o grupo também tem uma função fundamental na prevenção de novas violências, porque aqui a gente está falando de homens que já chegaram tendo respondido a um processo. O grupo pode ser efetivo para mitigar novas violências”, avalia a psicóloga Bárbara Silva da Rocha.

A participação dos homens atendidos nos Grupos Reflexivos na Vemepa, é determinada na própria sentença proferida no âmbito dos Juizados Especializados no Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (“Juizados Maria da Penha”). As reuniões acontecem a cada quinze dias e, antes de ingressarem nos grupos, os homens passam por uma entrevista individual com a equipe técnica, etapa que não era prevista no modelo de intervenção usado anteriormente pela Vemepa.

Criação

De acordo com a pedagoga Bianca Miranda Tribuzy, que divide com Bárbara Silva a criação e coordenação do projeto, os efeitos dessa escuta prévia individualizada são perceptíveis já no primeiro encontro coletivo.

“Quando chegam ao grupo, eles estão visivelmente mais tranquilos, pois já tiveram a oportunidade de serem ouvidos individualmente. Isso reduz a tensão que antes era comum no primeiro dia. Ao relatarem o que aconteceu em um ambiente acolhedor e sem julgamento, sentem-se mais à vontade para iniciar o processo de reflexão. Já não somos rostos desconhecidos para eles”, explica Bianca.

Metodologia

A metodologia aplicada capta os temas a partir das falas dos participantes e os direciona a entenderem a importância das discussões promovidas nos encontros. As coordenadoras desenvolvem temas como “estereótipos de gênero”; “saúde do homem”, “tipos de violência”, entre outros. Nos encerramentos dos grupos, o resultado vem nas frases ditas pelos participantes: “Eu não vou mentir, realmente eu cheguei aqui revoltado e muito resistente”. “Não estava contente de estar aqui, mas hoje, saindo, eu agradeço”. “Eu realmente vejo que isso aqui foi importante para a minha vida”. “Consigo aplicar o que eu aprendo, eu estou levando para fora, para as minhas outras relações, consigo aplicar em casa”.

Capacitação

As responsáveis pelo projeto perceberam em suas atividades práticas que a antiga metodologia utilizada, que consistia no desenvolvimento de palestras e terapias comunitárias, já não atendia mais aos objetivos do trabalho da equipe psicossocial da Vemepa. A alta rotatividade dos participantes, efeito da configuração em formato de grupo aberto, dificultava a construção de vínculo e a continuidade do processo reflexivo.

Alinhada à Recomendação n° 124/2022, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no ano de 2023 a equipe buscou outros modelos de intervenção junto à Escola Judicial (Ejud) do TJAM, o que motivou a realização do curso intitulado “Criação, Facilitação e Coordenação de Grupos Reflexivos e Responsabilizantes para Homens Autores de Violência Contra as Mulheres”. Ministrado na modalidade a distância, o curso foi ministrado pelo professor adjunto do Departamento de Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e professor do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFSC, Adriano Beiras e sua equipe de trabalho.

Atualmente, além das duas coordenadoras, compõem a equipe de facilitadores os estagiários de psicologia Giovana Oliveira Farias e Giuseppe Sciortino da Silva, e as estagiárias de serviço social Luana da Luz Silva e Thaynara Cavalcanti da Silva. Todos os integrantes concluíram o curso de capacitação oferecido pela Ejud/TJAM.

Fique por dentro

Lei no 13.984/2020,  alterou o art. 22 da Lei n.º 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), para estabelecer como medidas protetivas de urgência frequência do agressor a programas de recuperação e reeducação e o seu acompanhamento psicossocial, por meio de atendimento individual e/ou em grupo de apoio.

Recomendação 124/2022 – Em seu art. 1.º recomenda aos Tribunais de Justiça dos Estados que instituam e mantenham programas voltados à reflexão e sensibilização de autores de violência doméstica e familiar, com o objetivo de efetivar as medidas protetivas de urgência previstas nos incisos VI e VII do art. 22 da Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006).

Suspensão condicional da pena (sursis)

É prevista no art. 77 do Código Penal e pode ser aplicada em casos de violência doméstica quando a condenação for igual ou inferior a dois anos, desde que o juiz entenda que a medida é suficiente para reprovação e prevenção do crime. Entre as condições impostas estão a proibição de frequentar determinados locais, o comparecimento periódico em juízo e a prestação de serviço à comunidade, garantindo, assim, a proteção da vítima e a responsabilização do agressor. Cabe ao juízo da condenação analisar o caso e fixar as condições para o sursis, fundamentando a decisão na necessidade de proteção das vítimas e na eficácia da medida preventiva. Já o juízo da execução acompanha e fiscaliza o cumprimento das condições impostas, adotando as medidas necessárias para revogar o benefício em caso de descumprimento, assegurando que o ordenamento jurídico seja rigorosamente aplicado.

Veja também
Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *