
EXCLUSIVO Novo presidente do TJAM, Domingos Chalub (foto), fala sobre temas polêmicas que enfrentará no cargo. Foto: Rafael Alves/ TJAM/ Divulgação
Domingos Jorge Chalub Pereira, 70, toma posse na presidência do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) dia 3 de julho. Substituirá no cargo o desembargador Yedo Simões, numa cerimônia por videoconferência, a primeira da história, aberta no Youtube.
Chalub ficou conhecido pelas polêmicas como advogado. Eleito desembargador pelo Quinto Constitucional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em 2004, tornou-se um magistrado conciliador. “O advogado é franco-atirador e tem que provocar a polêmica. O magistrado precisa restabelecer a paz”, explica.
Nesta entrevista, EXCLUSIVA, o presidente eleito do TJAM falou sobre praticamente tudo. Afirma que, depois do vídeo em que desafiava decisão judicial, o governador Wilson Lima fumou o cachimbo da paz com o Judiciário. Tem conversado, aliás, tanto com governador quanto com o prefeito Arthur Virgílio, sobre a condução de Prefeitura e Governo na pandemia de coronavírus.
A questão da saúde quase retira Chalub da disputa da presidência. Ele ficou entre a vida e a morte, depois de acidente grave, em 2009. Recebeu próteses no ombro e no quadril. Às vésperas da eleição para presidente, os médicos fizeram exames para substituir essas próteses. “O tempo de recuperação, principalmente no quadril, leva de três a quatro meses. Isso prejudicaria a administração. Só depois, o médico disse que só vai precisar trocar daqui a quatro anos”, revela.
O presidente eleito afirma que vai trabalhar pelo cumprimento das metas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Promete um olho nos “neurônios do Judiciário”, os magistrados, e outro na “musculatura”, que são os demais funcionários.
Autodeclarado iluminista e positivista, Domingos Jorge Chalub Pereira abriu o jogo na entrevista a seguir:
Portal do Marcos Santos – O senhor chegou a desistir da candidatura a presidente do TJAM e só voltou atrás diante de apelo de outros desembargadores. Pode explicar o que aconteceu nesse processo pré-eleitoral?
Domingos Jorge Chalub Pereira – Comentei que ia desistir porque estava aguardando ordem médica. Tenho uma prótese de quadril e outra no ombro, em decorrência do acidente que sofri, em 2009. Expliquei que estava aguardando liberação médica. Estava em vias de voltar a São Paulo para substituir as próteses. A substituição, principalmente no quadril, leva de três a quatro meses de recuperação. Isso ia impactar a administração. Nesse meio tempo, o doutor Honda, que colocou a prótese, disse que não haveria problema. A reavaliação será em três ou quatro anos. Foi aí que retornei ao certame.
pms.am – Quer dizer que aquela história, de que o senhor não aceitava a disputa, porque seria ruim para o tribunal, não ocorreu?
Chalub – Foi um problema de saúde. Não ia concorrer e assumir, se eleito, e depois vir um médico dizer que não podia. Isso pode ocorrer ainda. Faço 70 anos em agosto. Na idade em que estou, e nessa pandemia, estou no grupo de vulneráveis. Se ocorrer impedimento médico e eu for obrigado a me afastar, paciência. Esses desígnios do organismo da gente, não entram em metas e planos.
pms.am – O senhor foi eleito no primeiro pleito com voto aberto do TJAM, com o colégio dos 26 desembargadores, obtendo 20 votos. Houve ainda um voto branco. É praticamente unanimidade na Corte. O que mudará, sob a sua presidência?
Chalub – Quero dar essa explicação e no meu pronunciamento, na posse, por videoconferência, vou ratificar isso. O CNJ está sendo muito dinâmico em estabelecer metas. O TJAM, com as diversas administrações, desde o desembargador João, desembargador Ari, Graça, Pascarelli, tem dado atenção para esse cumprimento de metas. Os servidores se engajaram nisso. O TJAM tem alcançado aqueles selos de ouro e diamante, por atingir as metas. Desde Pascarelli e João, consolidando com Yedo, todos os fóruns do Amazonas, todas as comarcas, estão informatizados. É tudo eletrônico. Isso traz uma produtividade muito grande. Minha meta é manter esse trabalho e alcançar essa produtividade exigida. O fim da prestação jurisdicional é a qualidade, efetividade e rapidez do serviço e do atendimento ao público. É por isso que o Poder Judiciário vem sendo provocado. As metas são estratégias do próprio CNJ.
pms.am – O senhor tem revelado preocupação, nesse processo online, com aqueles que não têm acesso à internet. Como pretende resolver isso?
Chalub – Estou muito preocupado com essas pessoas. Elas não têm o manejo suficiente dos recursos eletrônicos. Eles existem para comparecimento ao juízo e a expectativa de ver as pretensões julgadas. Com a peste, o meio eletrônico se tornou ainda mais fundamental. Uma das minhas metas é resolver o problema desse povo que não está tendo acesso.
pms.am – A pandemia – ou peste, como o senhor chama – ameaça ainda com uma crise econômica. O governador afirma que o Estado perderá de 30% a 40% da receita prevista para 2020. Isso significa diminuição do repasse aos poderes, como o Judiciário, TJAM. Como o senhor pretende enfrentar esse desafio?
Chalub – Vou prestar muita atenção na disponibilização financeira. Os valores repassados ao tribunal, pelo Estado, diminuem sim. É questão aritmética. Vou tomar muito cuidado, a desembargadora Nélia (Caminha, eleita corregedora geral) e desembargadora Karla (Maria Santos dos Reis, vice-presidente eleita) também, a partir de 3 de julho. Vamos tomar muito cuidado para não comprometer o pagamento do funcionalismo do tribunal. E, evidentemente, os subsídios dos magistrados, de um modo geral. Essa será a nossa maior preocupação. Numa situação como a que estamos vivendo no mundo, não dá para fazer nenhuma previsão espetaculosa.
pms.am – Tudo indica que ficará para sua gestão a volta – ou o restante dela – do TJAM ao trabalho presencial. Como o senhor acha que isso será feito?
Chalub – A produtividade do tribunal não mudou e, em alguns aspectos, até melhorou. Minhas metas serão centradas para resolver ou, pelo menos para fazer uma equação nisso, ouvindo, evidentemente, setores médicos, OMS (Organização Mundial de Saúde), para saber como é que pode voltar o tribunal a funcionar no atendimento ao público presencial. Será setorizado, claro, ou pode haver correria. A prestação jurisdicional é diferente do Executivo e do Legislativo. No Executivo, o governador tem que administrar o Estado inteiro e a viabilidade de abrir comércio e outras atividades. Nós somos concentrados. Nosso foco é no atendimento nos prédios do fórum e dos cartórios extrajudiciais. Temos menos dificuldade que outros poderes. Assembleia Legislativa também precisa abrir galerias e eles estão cuidando disso. Nosso foco será arranjar solução para a reabertura gradual.
pms.am – O que mudou no Chaloub, que foi advogado polêmico, espoleta, e hoje é um desembargador tido como conciliador?
Chalub – Primeiro a idade (risos). Você vai adquirindo mais experiência. A tribuna do advogado tem sim – e eu louvo isso – de fazer polêmica, provocar o debate. Mas a bancada do magistrado tem que ser equilibrada. O advogado, no bom sentido, é franco atirador, evidentemente usando dos recursos inerentes ao Estatuto da OAB, leis e Constituição. Tem imunidade nas suas expressões, na tribuna da defesa. O magistrado tem que ter conhecimentos da vida e jurídico. Um dos princípios da prestação da magistratura é pacificar os conflitos. Já se foi o tempo, porque isso era arcaico, que o Poder Judiciário dava solução ao conflito, mas não resolvia. Era como um desencargo. Hoje, atualmente, uma das missões precípuas do magistrado é restabelecer a paz junto às pretensões resistidas. Por essa razão, como sempre fui iluminista e positivista, acompanho o saber respeitando a fé de todo mundo. Essa foi uma das razões pelas quais não mudei meu espírito de democrata e debatedor. Mudei só o perfil e vou procurar isso sempre, principalmente agora, quando tenho o encargo administrativo e a condução política do tribunal. Não precisa dizer que é política no bom sentido, no diálogo com os Poderes e todas as instituições, Ministério Público, Defensoria Pública, OAB.
pms.am – Será, então, uma gestão marcada pelo diálogo?
Chalub – Dialogar sempre. O diálogo é uma das instituições que deveriam estar na Constituição: a obrigação de dialogar. Diálogo, desde sempre, foi apaziguador, dentro do próprio lar. Toda ação corresponde a uma reação. Essa é uma das razões pelas quais o mundo, até hoje, ainda não resolveu o problema dos crimes. Desde antes de (Cesare) Beccaria (iluminismo penal e Escola Clássica do Direito Penal), nós aprendemos a tipificar as condutas, mas o mundo não sabe o que fazer com quem pratica o crime: se mata, educa, prende, libera… Na minha visão, em meus estudos, penso que isso faz parte da dinâmica da sociedade e nunca terá solução. É preciso diminuir os danos. Ninguém conhece nenhum país sem infração penal. Não existe.
pms.am – Como ficou a relação do TJAM com o governador Wilson Lima, depois daquele vídeo em que ele se revelou contra decisão judicial no hospital Nilton Lins? Depois veio outro vídeo, apaziguando, em que o governador afirmava ter sido o pronunciamento feito no calor da pandemia. Qual a relação do Judiciário com o governador?
Chalub – Marcos, eu acompanhei isso e, logo em seguida, como disseste, o governador fez a explicação do que tinha dito. Pelo que tomei conhecimento, o desembargador Yedo, presidente, estabeleceu uma relação institucional muito saudável. Conheço Wilson Lima desde que se candidatou a vice do Marcelo Ramos. Tenho relação amistosa com ele. Acho que não haverá problema nenhum, primeiro que o perfil dele é de comunicador.
pms.am – Qual sua opinião sobre a condução que o governador e o prefeito Arthur Virgílio vêm fazendo das medidas contra a pandemia?
Chalub – O Wilson foi eleito pelo povo amazonense, mas, como todos os eleitos, não contava que essa nossa geração ia ser acometida por essa peste. Isso está deixando todos, eu inclusive, fora parte de que ele vai cumprir ou não ordem judicial, estou sentindo, não como desembargador ou presidente de tribunal, o esforço dele para contornar a situação de catástrofe e tragédia. Da mesma forma, o prefeito Arthur também se despojou das suas hostes político-partidária e os dois trabalham em conjunto, no benefício superior de todos nós. Vou, então, assumir a presidência, dia 3 de julho, mantendo o relacionamento institucional com todos os poderes e instituições. Inclusive, pelo telefone, vou conversar com governador, presidente da Assembleia e prefeito Arthur Neto. Tenho, aliás, conversado com todos. Evidentemente, sem perder a autonomia do Poder Judiciário, mas com harmonia. Não existe supremacia de poderes e sim o cumprimento da Constituição, a Lei Mãe. Aprendi, há muitos anos, com um magistrado aposentado há tempos, o Esdras, que era desembargador do Distrito Federal e territórios. Ele concorreu ao Tribunal Federal de Recursos, depois STJ, sem êxito. Dizia: “Magistrado, quando vai dar decisão, tem que ver se ela tem condição de ser cumprida ou não. Se não, você causa um problema institucional ou vai ser desmoralizado”. Eu era advogado. Era década de 80 ou 90. Quando o magistrado toma medida de impacto é preciso que ouça as vozes da experiência ou vai causar problema. Também não pode ficar acovardado. Quando chega na presença do magistrado um pedido de liminar é porque, entre as partes, o clima está acirrado. Ninguém pede liminar combinando com o outro. Como dizia o Garrincha, “combinando com os russos”. O relacionamento está desgastado, acirrado, tendo no meio capricho, vaidade, uma série de conotações inerentes ao ser humano que escapam dos códigos, das leis. É preciso prudência e ouvir assessores, colegas mais velhos. É isso o que faço.
pms.am – O senhor acha viável que os poderes façam um balanço econômico-financeiro dos resultados da pandemia? O presidente do TJAM, Yedo Simões, por exemplo, anunciou o rompimento ou redução numa série de contratos de manutenção, uma vez que os prédios não estão sendo ocupados.
Chalub – Os prédios não estão abandonados. Estão fechados, mas o desembargador Yedo reduziu o dispêndio de manutenção porque o lixo maior é causado pelos seres humanos. A higienização contra mofo está mantida, embora de forma reduzida. Lógico que houve uma diminuição do dinheiro gasto. Isso daí vai sim, o desembargador Yedo, tenho certeza absoluta, vai fazer a transparência para o contribuinte, inclusive na Comissão de Transição, ele com os assessores dele e a nossa administração com os nossos. Isso está computando tudo, para saber da destinação de verba. Temos compromisso com o Tribunal de Contas do Estado (TCE), que tem atribuição de verificar para onde vai esse dinheiro.
pms.am – Será que sobrará dinheiro para, por exemplo, cobrir a provável queda no repasse de recursos?
Chalub – Os poderes não podem fazer poupança. Isso não é empresa. Não dá para entesourar dinheiro. O Executivo, quando entesoura, causa problema em alguma atividade junto ao povo. Nós não podemos entesourar, nem fazer poupança, nem aplicar o dinheiro. Não temos lucro. Temos que investir cada vez mais. Em administrações remotas, um chegava para o outro e dizia “estou te passando não sei quantos milhões no cofre”. Não tem que passar cofre mais não. Tem que dizer como gastou. Os neurônios, que são os magistrados, estão resolvidos. O problema é a musculatura, os servidores. São eles que, em última análise, representam o fundamento dos selos de qualidade que o CNJ confere. O magistrado, sozinho, sem assessoria, não faz absolutamente nada. Um servidor, sozinho, produz muitas coisas. Só não faz decidir, mas até a decidir ele ajuda. Tanto é que, nas empresas privadas mais avançadas do mundo, você não conhece nenhum empregado, que chamam de colaborador, que não viva, dentro das possibilidades, com as necessidades básicas supridas: educação, saúde, vestuário, habitação, alimentação e repouso. São as bases estruturais das fontes produtivas, na relação de produção. O tribunal tem que ficar centrado nisso, no servidor, todos os servidores. Evidente que, quem discrepar, sofrerá as sanções que a Lei Administrativa impõe.
pms.am – Sua posse será a primeira da história do Judiciário amazonense por videoconferência. Como será?
Chalub – Dia 3/07, sexta-feira, faremos a posse por videoconferência. Participam autoridades e a transmissão será aberta, no Youtube. Tem que ser aberta.
pms.am – O senhor gostaria de deixar mais alguma declaração?
Chalub – Minha última declaração é de solidariedade às famílias que perderam entes queridos, como eu próprio perdi amigos. Que a ciência, acompanhada da fé espiritual, consiga iluminar os cientistas para que cheguem a um remédio sem panaceia, nem perfumaria. E a uma vacina que nos liberte desse genocídio trazido por esse vírus. Isso daí é uma evolução da matéria que só os cientistas estão estudando para explicar. Tenho muita confiança na ciência, sem perder a fé, porque a fé é que também ilumina os cérebros cognoscitivos desse saber científico.
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